segunda-feira, 26 de agosto de 2013

Solo para estrelas e poetas...

Fatima Dannemann

Noite...
Nada na rua...
nem um som,
somente estrelas num pedaço de céu
astros vadios vagando no universo
a flutuar serenas
numa dança cósmica...
Noite...
E um poeta solitário
sonha com o dia...
Estrelas brilham
serenas
como bailarinas num
pas-de-bourré cadenciado...
E o poeta teimoso
fala sobre flores...
Não importa se o mundo lá fora
está noir como um velho filme antigo...
Não importa se todos dormem,
a alma do poeta está sempre em estado de alerta.
E enquanto as estrelas brilham sossegadas,
o poeta tangencia as letras
como um arco a manejar um violino
num solo dolente, talvez triste.
Noite...
E não importa a hora.
Na alma do poeta,
alegre ou triste,
há sempre flores coloridas.
Mesmo que essas flores
sejam estrelas,
astros fugidios,
dançando no céu
como um corpo de baile
de uma dança cósmica.

Salvador, 15.5.2003

domingo, 2 de junho de 2013

Canto Xamânico



Fatima Dannemann

 
Terra, fogo, água e ar
Luz no planeta
verde na terra,
branco nas águas,
azul no mar
vermelho no sangue dos bichos,
pulsa vida de um pólo a outro
pulsa vida de norte a sul...

Mãe, pai, filho,
irmãos homens, mulheres,
irmãos minerais, animais e vegetais,
salvem a vida na terra,
e pulse a paz de um pólo a outro
e pulse a vida em paz de norte a sul.

Luz do planeta
a terra é azul
e o mar as vezes é verde.
Dourados como sol, nadam os peixes,
Vermelho é a cor do amor a vida
que pulse a esperança verde como a grama,
que pulse a harmonia branca como a paz
que pulse a paz azul como o planeta...

Pais e mães ensinem aos filhos,
salvem irmãos animais, vegetais e minerais,
salve a vida que pulsa de um pólo a outro,
pulse a harmonia em todas as tribos
vivam as vidas e no planeta, paz! 

terça-feira, 28 de maio de 2013

Poema Engarrafado



Fatima Dannemann

Caos...
Alguém buzina.
O vermelho do sinal fere os olhos.
O verde mora no sonho de chegar logo.
Um rádio toca
ensurdece a paisagem.
O mundo paralisado
quer chegar a algum lugar.
Trânsito, louco trânsito.
No engarrafamento,
só filosofias contra a pressa de chegar
O mundo para por completo
e eu penso
porque é que no carro ao lado
tem sempre alguém
tirando meleca do nariz.

terça-feira, 14 de maio de 2013

Toque


Fatima Dannemann

Uma nota
um tom
um som
sei lá
se o sol
em si ou mi
toca o piano
e faz se
a musica
em qualquer tom
maior ou mais intenso
menor ou plus que lent
allegro ma non troppo
seja uma nota
musical
ou no jornal
uma cadência
um toque
ou um aviso
seja uma musica
ou apenas um ensaio
de peça no palco
de peça no carro
e samba no pé
seja nota
ou seja som
sei lá se o sol
aqui ou la
fa si a face
ali ou em mi

terça-feira, 19 de fevereiro de 2013

Um velho texto escrito na ´época do atentado do WTC: Geopolítica para loiras

by Fatima Dannemann (loira de nascença...)

Para que as loiras possam entender o noticiário internacional sobre os acontecimentos em Nova York em 11 de setembro de 2001:

- terrorista não é personagem de filme de terror
- Drácula e Frankenstein, portanto, não são terroristas
- Terrorista logicamente não pode ser turista que visita a Transilvania ou faz o circuito dos Fantasmas em Edimburgo...
- Nova York não é capital dos Estados Unidos
- Os Estados Unidos não ficam na Europa.
- Na Inglaterra se fala inglês e nos Estados Unidos, também, mas a Inglaterra é outro país.
- Mulçumano não é irmão de Mussun dos Trapalhões
- O Afeganistão existe mesmo e fica na Asia, pra lá do Iraque e do Paquistão
- Mas ninguém mora no afeganistão por que tem problemas respiratórios e "afega" muito
- Arabe é árabe. Iraquiano é iraquiano. Palestino é palestino. Vestem modelitos parecidos mas nenhum
deles foi desenhado por Giorgio Armani, qui num nasceu na Armenia, qui aliás não tem nada com a briga...
- Talibã não é o personagem de A Tempestade de Shakespeare pronunciado por criancinhas pequenas. O personagem é Caliban e foi escrito muito antes de Nova York existir...
- O Oriente Médio não é baixinho nem usa sapato alto
- As torres gêmeas não são univitelinas, nem bivitelinas... Tampouco são do signo de gêmeos...
- É perigoso ir para baixo dos escombros catar dólares porque a Polícia pode lhe confundir com batedor de carteiras.
- Aliás, alta do dólar significa que seu perfume preferido passa a custar duas vezes mais caro e que os batons lancome logo
chegarão a cem reais mesmo que a coleção seja do ano passado...
- Mercado Financeiro não é shopping center de cambista
- Vôo cancelado não é um jegue alado que arranca a cancela do pasto para voar.
- Saidas bloqueadas da cidade não são portões feitos com blocos de brinquedos legos
- O síndico do Empire States não vai precisar ficar com inveja do síndico do World Trade Center
- Remake de King Kong em outro local é a última preocupação do governo americano neste momento
- O que passou na televisão não foi o filme "Inferno na Torre"
- Aquele lencinho que os árabes usam na cabeça não é fashion, embora seja cheio de atitudes politicamente incorretas, apenas faz parte da vestimenta deles.
- Fique tranquila. Não existe terrorista exterminador de loraburra, entào seu prédio não será explodido, a menos que você faça alguma barbeiragem quando estiver cozinhando.

As meninas do travesseiro

Maria de Fatima Dannemann

 Viajar de carro nunca foi meu esporte preferido, especialmente quando a viagem é muito longa e o carro quebra no caminho. Foi isso mesmo que me aconteceu uma vez. O carro do jornal quebrou numa dessas cidades que nunca ouvira falar antes até passar por ela. Pior, até passar algumas horas nela.
Aconteceu já faz muito tempo, ainda trabalhava no primeiro jornal de meu currículo de jornalista e voltava de Jacobina com motorista e fotógrafo, o famoso Raimundo, o Mala, quando o velho 93 simplesmente resolveu quebrar num lugar perfeito para Judas bater as botas: Capim Grosso.
Imagine uma cidade tipo cenário de novela. É ela própria. Pracinha, prefeitura, delegacia, igreja. Algo que me lembrava Sucupira, Asa Branca, Resplendor ou qualquer outro desses lugarejos fictícios mas que retratam a realidade. Capim Grosso era assim na época. Imagine eu e o Raimundo rodando pelas ruas sem ter o que fazer. Em menos de uma hora conhecemos tudo o que havia para conhecer e o motorista ainda na oficina tentando reparar o defeito do carro.
Hoje, refeita da aventura digo com conhecimento de causa: o povo do interior só não morre de tédio porque tem bom humor e consegue ser simpático com todo mundo, especialmente com seus visitantes pois fui muito bem tratada. Isso fui. Mas cá pra nós, não se tem nada para fazer em cidadezinhas baianas perdidas em entroncamentos de estradas. Por isso que eu resolvi puxar papo com os moradores da cidade, pessoas hospitaleiras, simpáticas, conversadeiras, e nessas e outras, fomos parar numa loja de travesseiros, onde duas meninas não tiravam os olhos do fotógrafo que se sentia um verdadeiro Deus de Ébano cheio de ibope.
As meninas começaram a nos bombardear com perguntas sobre Salvador, onde ela nunca estiveram antes, sobre barzinhos, coisa e tal, eu contra-ataquei: o que tem para fazer aqui? Nada. Cinema não existe. Jogar sinuca no bar era proibido peara mulheres. Conversar na pracinha, espiar os carros que atravessam a cidade indo para outros lugares. “Não sentem falta de praia?”. Elas responderam que não. “Lá embaixo tem um rio. Quando o calor aperta a moçada vai toda pra lá”. Achei simplesmente impossível viver num lugar sem shopping center, sem discoteca, sem uma livraria ou loja de disco mais transadinha.
Não é o fim do mundo, elas me garantiram.  E acho que era verdade, via duas meninas sem neurose de cidade grande, que moram em casas com quintal enorme e algumas árvores frutíferas, e todas duas muito tranqüilas. Sem se importar em se sacolejar três horas numa estrada esburacada para chegar a Feira de Santana, a ‘metrópole” mais perto de lá.
Na falta de modernidades, elas sonham o ano inteiro com o São João em Mairi, uma cidade próxima, onde a festa é uma gloria. E a vista para o mar? As meninas me olharam com ar blasé e contam vantagens: ‘grandes coisas, moramos com vista para o sertão”. Perguntei ainda sobre barulho, pivete, ladrão, ela disseram que não tinha nada disso, e comecei a falar sobre os rapazes da cidade, mas o 93 ficou pronto e eu finalmente deixei a cidade. Bastante entediada, claro, pois nem havia onde tomar um picolé, mas com uma bela aula de que se pode ser feliz com menos do que a gente acha que precisa.

sábado, 16 de fevereiro de 2013

Beleza Negra




Maria de Fatima Dannemann

Moro na cidade mais negra do mundo.
Mas não entendo porque meninas vão a farmácia
e se transformam em loiras sem tchan.
Moro na cidade mais negra do mundo.
Não importa o riso admirado dos turistas,
nem as lentes de máquinas digitais
de olhos dinamarqueses bem azuis.
A cidade, a minha cidade é negra
apesar do azul do mar e do colorido de seus edificios.
Moro numa cidade negra e sou branquela,
mas me contamino por seu brilho de beleza.
Salvador, beleza negra,
Não importa se o que a TV mostra
tem brilhos de loiros cabelos catarinenses,
ou olhos azuis extasiados, mas alienígenas,
que não compreendem o que é estar na Bahia.
Moro numa cidade negra,
e capto a beleza de sua alma reluzente.
Salvador é ímpar.
E por ser única, não se contamina.
E por não se contaminar, cativa.
Moro na cidade mais negra do mundo.
Nos terreiros, ru, rumpi, lé,
soam atabaques triunfantes.
Na Barra, Curuzu, Cabula, Caminho das Arvores,
faces diversas de uma cidade múltipla
e ao mesmo tempo ímpar e única.
Emoldurada pelo mar, de quase todos os lados,
restos de florestas.
Macacos que pulam nos galhos das amendoeiras
da Pituba. E bem ali em frente:
Santa pós-modernidade!!! Um shopping center.
E na Bahia se vai do Pelourinho as vitrines
fechadas apenas tomando o frescão.
Moro numa cidade negra.
Este é meu berço. O Porto da Barra.
No mesmo berço da cidade.
Salvador, negra como a noite mais escura,
brilha, como a estrela mais brilhante.
Suas ruas são veias onde seu povo
pulsa vida.
Moro na cidade mais negra do mundo.
E não entendo como meninas vão a farmácia
pintar os cabelos
para aparecer na TV.

Cidades e pessoas



Fatima Dannemann©

O quanto você conhece uma cidade?
O quanto você conhece uma pessoa?
Ninguém conhece uma cidade
apenas por seus pontos turisticos.
Ninguém conhece ninguém
apenas com roupas de festas.
Despida a maquiagem, a cidade se abre para seus becos.
Quando troca a roupa de festa, a pessoa mostra suas imperfeições.
Uma cidade se conhece por seus becos.
Um ser humano se conhece por seus segredos.
Quando ele e a cidade despem as máscaras.
Quando um lenço de papel retira a maquiagem
e revela a verdadeira face. Os becos.
Becos humanos são furos na alma.
Mas a alma da cidade está nos becos.
Ah, e nas feiras.
E seres humanos por suas roupas diárias.
Ah, e por seu estômago.
Feiras e mesas revelam gostos, e traem os rostos.
Gulosos não escondem defeitos...
No canto da boca, a baba que escorre,
No meio do rosto, olhos que brilham de desejo.
E em meio a festa, seres humanos mostram segredos.
O sangue que corre nas veias esconde-se por traz dos vestidos,
do terno e gravata, do sapato de salto luiz quinze.
E os becos??? Os becos são as veias da cidade.
Veias da alma. Lá está o lado que as roupas de festas
escondem. Provisoriamente.
O quanto você conhece de sua cidade?
O quanto você conhece de seus amigos?
O quanto você conhece de você mesmo?
Quais são seus becos, seus medos, seus defeitos, suas manias???

sexta-feira, 15 de fevereiro de 2013

Traiçoeira



Fatima Dannemann

A rosa é traiçoeira
Bela, sim
Perfumada, tambem
Farta em pétalas, coloridas
mas traiçoeira.
A rosa guarda os espinhos
sob as vestes de cores vistosas
e fere a carne de quem lhe toca
e fere a alma de quem lhe admira.
A rosa é assim
uma face no vaso distante,
e sempre em grandes quantidades
pois uma única rosa não basta
para embelezar o jardim.
Ao contrário do girassol
a rosa é blasé
e não sabe se é dia ou noite
do alto de sua pose
faz pouco caso da vida
e fere com seus espinhos.
Ao contrario dos cactos que se mostram
ela esconde.
E esnoba outras flores.
Desejada, talvez.
Mas ao pressentir perigo,
todos correm.
E vem o castigo:
a rosa morre seca, sozinha
e é jogada no lixo.

Canto para as águas mansas



Fatima Dannemann©

Dorme o lago cercado por montanhas
Sombras que ameaçam
Brisa que murmura

Que mistérios existem em suas entranhas?

As brumas que lhe encobrem
são véus
de nuvem com ares de céu

Que monstros e mitos se encobrem sob tuas ondas?

Uma nesga de sol
rasga suas águas...
Molha de luz a superfície gelada
e é como espada
a rasgar a carne inerte

Que luas te banham de prata?

Gaivotas gritam
Cisnes deslizam no silêncio
Um barco apita

Será que dentro do lago existe vida?

O vento beija a água
uma onda se arrepia
e quebra na margem
borbulha...
Um canto de água que chega ao céu
e explode na terra

E as águas do lago correm mansas
a elas pouco importam tempo e espaço
ontem, hoje ou amanhã
A elas só importa o vento...
seu vai e vem
e vai e vem...